quarta-feira, 29 de maio de 2019

SINAIS


OS SINAIS


Uma das coisas que mais me chamou a atenção, quando me comecei a interessar pela política, foram os sinais do comportamento humano em relação aos políticos, aos partidos e ao próprio sistema de governo. Na minha mente sempre reaccionária, não foi novidade sentir-me convidado a ler a realidade a partir duma consciência crítica.
Conhecer e falar com pessoas de todas as gerações, com os pais, os filhos (como eu) e os netos do 25 de Abril de 1974, foi para mim a melhor universidade, o melhor livro, o melhor documentário, a que eu podia recorrer e continuo a recorrer. As pessoas transmitem-nos mensagens que muitas das vezes nem sabem que o fazem, dizem-nos qual é a sua ideologia política, o porquê, o porque votam ou o porque não votam. Elas mostram-nos o seu conhecimento, a sua ignorância, a sua indiferença ou a sua preocupação. Elas revelam-nos como são manipuláveis, influenciáveis ou inflexíveis.
O comportamento humano não é assim tão complexo, ele pode é ser objecto de múltiplas interpretações, dependendo dos interesses que as fomentam. Se a isto acrescentarmos que em jogo estão enormes forças ocultas de transformação e de manipulação, condicionando as pessoas a comportamentos forçados, talvez isso é que por vezes dificulta a sua interpretação.
Estas eleições Europeias de 2019, revelaram-nos tanto que só os mais distraídos ou aqueles que estão limitados por condicionalismos políticos não conseguem vislumbrar os sinais.



Olhemos para as seguintes tabelas, nelas existem várias conclusões que podemos retirar:


Resultados de 2014
Resultados de 2019
Diferença
Inscritos:
9.702.657
10.786.068
+1.083.411
 Votantes
3.283.610
3.314.414
+30.804

Não votaram
6.419.047
7.471.654
+1.052.607
Em Branco       
144.951
140.949
-4.002
Nulos
100.506
88.960
-11.546
TOTAL:
6.664.504
7.701.563
1.037.059



No Estrangeiro
Resultados de 2014
Resultados de 2019
Diferença
Inscritos          
244.986
1.441.570
+1.196.584
Votantes
5.129
13.812
+8.683


Não votaram
239.857
1.427.758
+1.187.901
Em Branco       
150
174
+24
Nulos
35
78
+43
TOTAL:
240.042
1.428.010
+1.187.968


A primeira conclusão é que a abstenção não subiu, pelo contrário diminuiu, se considerarmos apenas o número de inscritos de 2014. Ou seja, como se sabe o número total de eleitores inscritos aumentou com mais 1.196.584 portugueses, por via do recenseamento automático, se subtrairmos 1.427.758 de abstencionistas estrangeiros ao número total de abstencionistas (nacionais + estrangeiros) 7.471.654, podemos verificar que a abstenção baixou de 6.419.047 (em 2014) para 6.043.896.
E é essa diferença de cerca de um milhão de eleitores a mais que faz a abstenção ser maior em percentagem mas de facto ser menor em número absoluto de votantes.



Resultados de 2014
Resultados de 2019
Diferença

CDU - PCP-PEV
416.446
228.156
-188.290
B.E.-Bloco de Esquerda
149.628
325.533
+175.905
Soma:
566.074
553.689
-12.385

A segunda conclusão, onde é que vocês acham que o Bloco de Esquerda foi roubar eleitores? Não existe novidade aqui, um PCP envelhecido ideologicamente, cheio de militantes com o pé para a cova e um líder com o discurso da “cassete camarada” contra um partido fresco, moderno, representantes femininas simpáticas, bonitas, cultas, inteligentes, um discurso aberto, compreensível. Que outra coisa seria de esperar, dos simpatizantes do comunismo senão saltar de um partido gasto para outro novo e moderno?





Resultados de 2014
Resultados de 2019
Diferença

L-Livre          
71.602
60.575
-11.027
PCTP/MRPP
54.622
27.223
-27.399
PTP
22.531
8.640
-13.891
MAS
12.442
6.641
-5.801


TOTAL:
-58.118



A terceira conclusão a esquerda não ganhou. É também evidente, independentemente do Bloco ter ganho mais votantes porque os foi roubar ao PCP, que os dois juntos perderam 12.385 votantes. Terão saltado para o PS? Em resumo a Esquerda não ganhou, muito pelo contrário!







Resultados de 2014
Resultados de 2019
Diferença

PS    
1.033.158
1.106.328
+73.170



A quarta conclusão, o PS apenas roubou votos à esquerda. Se somarmos 12.385 de votantes que fugiram do PCP e não foram a correr votar no Bloco, porque não devem ter gostado muito daquela “brincadeira dos professores” em que o PCP e o Bloco se juntaram ao PSD e deslumbraram no PS um momento de responsabilidade política (Esqueceram os incêndios, as greves, etc…), mais os 58.118 cansados do Livre, do PCTP/MRPP do PTP e do MAS, ou seja da esquerda em geral, ficamos com 70.503 de eleitores, que com mais uns “pozinhos” dos novos inscritos deram os tais 73.170  a mais, de votantes no PS. Será isto uma grande vitória?... Não me parece!






Resultados de 2014
Resultados de 2019
Diferença


PPD/PSD.CDS-PP Aliança Portugal
909.932


PPD/PSD

727.224

CDS-PP

205.106


SOMA:
932.330
+22.398
ALIANÇA

61.753


SOMA:
994.083
+84.151


A quinta conclusão, a direita tradicional não perdeu. Quando olhamos para algo, devemos contemplar o seu todo. Em 2014 o PSD e o CDS concorreram juntos tiveram 909.932 votos, considerando que ambos voltavam a concorrer juntos este ano, afinal teriam tido mais 22.398 votantes, e não nos podemos esquecer que Santana Lopes saiu do PSD para criar o Aliança levando consigo muitos militantes, possivelmente os 61.753. Somando todos estes votantes dá o resultado de 994.083, ou seja um aumento de 84.151 pessoas. Se estes partidos tivessem concorrido juntos, tal como o fizeram em 2014, quem pode afirmar que tiveram uma derrota?






Resultados de 2014
Resultados de 2019
Diferença

MPTPartido da Terra (Marinho Pinto)
234.603 votos


PDR(Marinho Pinto)

15.790
-218.813

Nós , Cidadãos (Paulo Morais)

34.672



A sexta conclusão, é que já não existem salvadores da Pátria! Marinho Pinto o homem que quando ainda era Bastonário dos Advogados apregoava à abstenção e que falava muito mal do projecto europeu e da classe política em geral, vestiu o fato de político e mudou com tamanha hipocrisia, toda a sua retórica. Marinho Pinto que denunciou o salário "vergonhoso" dos eurodeputados mas que faltou à sessão que votou propostas de redução. O ex-eurodeputado, que quando chegou a Bruxelas em 2014 e se queixou do salário mensal de 20 mil euros, reafirmou que as suas declarações foram “deturpadas”.

“O dinheiro que me dão não o deito fora, mas não é isso que está em causa. O que está em causa é que se pague tanto a deputados para fazerem aquilo que fazem e sobretudo para representarem politicamente os eleitores”, argumenta Marinho Pinto. Afinal, Marinho Pinto quis renovar o mandato de eurodeputado.
Talvez por isso, é que Paulo de Morais não alcançou o resultado pretendido, pois com este tipo de falsos heróis os portugueses estão demasiado desiludidos. Afinal de que serviu a Associação Frente Cívica senão de trampolim para mais uma candidatura, agora a de eurodeputado?


PPM
17.732


PPV
12.017


BASTA (Chega+PPV+PPM)

49.496
+19.747


PNR
15.036
16.165
+1.129


A sétima conclusão, os portugueses não gostam de conservadorismos, nacionalismos, muito menos de reizinhos! Eu confesso que simpatizo com histórias de príncipes e princesas, sou apaixonado por castelos e museus, aprecio muita coisa que os nossos antepassados fizeram em prol da pátria, e até sou cristão, provavelmente até poderia identificar-me com este grupo de partidos mas não é o caso. Em primeiro lugar, o tempo dos Reis acabou e o argumento que nos países monárquicos vive-se melhor é mera falácia, afinal o que faz o rei ou rainha nesses países senão ser uma mera figura, um símbolo, uma marioneta nas mãos da burguesia, igual a qualquer Presidente? Em segundo lugar, outrora Portugal foi uma grande Nação, um Império até, mas esse tempo acabou e a geopolítica mundial mudou completamente, portanto ser nacionalista não faz sentido nenhum nos nossos tempos. Estamos no séc. XXI, para quê regredir agora, quando falta tão pouco para a Democracia ser verdadeiramente conquistada?
O aumento de 19.739 votantes na coligação Basta mais os 1.126 no PNR, que significado poderá ter senão a resposta de um pequeno grupo de cidadãos, revoltados com os imensos casos de corrupção, abuso de poder e desnorte político de há 45 anos a esta parte e que desejam por vias mais radicais colocar ordem nisto tudo?






Resultados de 2014
Resultados de 2019
Diferença


PND  
23.046


PDA
5.300


POUS
3.695


TOTAL:
44.483





PAN  
56.363
168.501
+112.138

PURP

13.582


A oitava conclusão é que os partidos que defendem nichos da população jamais irão longe mesmo quando por vezes estão na moda. O caso do PURP que se assume como representante de todos os reformados, e tem por isso um público-alvo e a defesa de interesses específicos de uma parte do eleitorado. Por último o caso do PAN que defende os animais, mais até do que as pessoas, mas quem não gosta de câezinhos e gatos fofinhos?
Não me parece que o PURP venha a competir no campeonato principal dos grandes partidos, até porque com a idade da reforma cada vez maior, o seu eleitorado não andará cá por muito tempo (desculpem a piada).
Já o PAN parece-me ser um partido que se não fizer asneira, (parece-me é que brevemente a irá fazer, basta só aceitar o namoro do PS para se coligarem) irá capitalizar imensos votos de todas as frentes politicas, tais são as causas que defende como também a sua postura política. Nestas eleições muito provavelmente foi buscar uma mão cheia de votantes desagradados com Marinho Pinto e de todos os partidos que este ano deixaram de concorrer. Contudo a sua limitação política quanto â defesa extremista dos animais irá condicionar o seu crescimento, e no dia que queira flexibilizar essa defesa, simplesmente deixará de fazer sentido a sua existência.

CONCLUSÂO:

Em conclusão, perceber os motivos que levam o povo a votar ou a abster-se é uma tarefa simples pois os sinais do seu comportamento são-nos revelados com clareza, basta para isso olhar para os números. Esses sinais revelam-nos que muitos votam por respeito aos partidos e ideologias, é como pertencer a um clube de futebol, jamais se muda de clube. Alguns forçados por pressões familiares, outros por pressões sociais, outros porque muitas vezes votam, em desesperada fuga, a um mau desempenho do partido de que sempre gostaram e não porque acreditam lá muito no que escolheram, mas à falta de melhor. Muitos outros eleitores, por esse interior, como temos conhecimento, que vão votar naquele partido que “patrocina” o autocarro para os levar às urnas, e que lhes der uns miminhos (esferográficas e bandeirinhas) de preferência com a cor em que devem votar, (não vão eles ser analfabetos, burros ou ignorantes). Também temos aqueles (cada vez menos) que ainda acreditam em milagres, na vinda do D. Sebastião e em todo o tipo de salvadores da pátria. Em suma, porque acreditam nas promessas dos políticos, e em 45 anos de democracia representativa mesmo as desilusões sendo inúmeras, por masoquismo continuam a fazê-lo, já que ainda não lhes foi apresentada uma alternativa de regime melhor, e tal como um prisioneiro que só lhe servem comida estragada não tem alternativa melhor do que comer o que lhe dão, quem vota também se resigna ao que tem, (a ilusão deste tipo de democracia).
Já os abstencionistas têm também motivações diversas e uma delas não é mentira que muitos preferem ir para a praia, para o campo ou ficar em casa a dormir, indiferentes a tudo e a todos. Estes só percebem de futebol e é o futebol que os faz vir para a rua, são completos inúteis para a sociedade e se pagam impostos é porque são obrigados, democracia ou ditadura para estes é igual desde que não os afecte. Mas outros abstêm-se porque vão ficando cada vez mais informados, mais esclarecidos sobre como funciona mal este tipo de democracia (democracia representativa), vão se libertando das amarras sociais, familiares e partidárias e porque cada vez vão ficando mais desiludidos com este sistema democrático, estes cidadãos são abstencionistas que se interessam por política, apenas querem outro sistema de governo e se não votam é por retaliação ao que está mal. A verdade é que para estes abstencionistas votar neste sistema e nestes políticos não é uma atitude cívica muito menos democrática, para eles atitude cívica e verdadeiramente democrática é votar em referendos ou petições. Porque diabo haveriam de votar nestas eleições europeias se a entrada de Portugal no Euro não foi referendada, se o memorando da Troika não foi referendado?
Se é de Democracia que falamos, temos de ler os sinais e eles dizem-nos que  o Povo na sua maioria não está bem, quererá a mudança do regime? Eu penso que sim!

Sotnas Drago

Dados: www.europeias2019.mai.gov.p